Propostas para extinguir cursos de humanas movimentam portal e-Cidadania.
Extinguir ou manter os cursos na área de humanas nas universidades públicas? Duas propostas com esses objetivos distintos estão atraindo milhares de internautas ao portal e-Cidadania, plataforma do Senado que possibilita a participação da sociedade nas atividades legislativas. Já são quase 60 mil manifestações registradas, a maioria a favor da manutenção das disciplinas de filosofia, história, sociologia, entre outras.
Esse debate foi provocado pelo cidadão paulistano Thiago Turetti, autor da ideialegislativa de extinguir os cursos na área de humanas. Para ele, o país precisa de mais médicos e cientistas, por isso não considera adequado usar dinheiro público e espaço para cursos de humanas como geografia, artes, artes cênicas entre outros. Ele opina que esses cursos podem ser realizados presencialmente e a distância em qualquer instituição privada. O objetivo da proposta dele é dar mais ênfase a “cursos de linha”, como medicina, direito e engenharia em suas diferentes modalidades.
"A proposta visa a um melhor direcionamento do dinheiro do contribuinte. Nosso país precisa desenvolver esse senso de prioridade. Como contribuinte, eu quero que meu dinheiro seja investido para a formação de cientistas, engenheiros e médicos. Hoje, os cursos de humanas não cumprem com o seu currículo, simplesmente transformam os estudantes em militantes de esquerda. Essas pessoas protestam em favor do aborto e da legalização da maconha", argumenta Thiago Turetti.
Em resposta, a cidadã paraense Acsa Silva propôs uma ideia legislativa com objetivo oposto. No texto, ela sugere a permanência dos cursos de humanas nas universidades públicas, visando assegurar a realização presencial desses cursos em universidades públicas, assim como os “cursos de linha”. Essa proposta já registrou mais 50 mil manifestações de apoio, por isso deve seguir para apreciação da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH).
"A extinção dos cursos de humanas de universidades públicas estará obrigatoriamente direcionando o cidadão a pagar por esses cursos. Grande parte da população brasileira é de baixa renda, não disponibilizando de condições financeiras suficientes para pagar por esses e outros cursos. O país precisa de mais acesso igualitário à educação em todos os níveis de ensino", justifica Acsa Silva na apresentação da proposta.
Espaço de participação
Para o senador Paulo Paim (PT-RS), o e-Cidadania cumpre um papel fundamental, pois é um espaço que as pessoas têm para participar dos grandes debates e das causas que vão influir nas suas vidas. Ele comentou como duas propostas antagônicas podem ajudar a embasar o debate entre senadores e especialistas em audiências públicas.
- Consulta feita, 7 mil pessoas responderam que são a favor de retirar os cursos de humanas das universidades. Já o contrário, a proposta para manter cursos humanitários recebeu 50 mil apoios. Esse número é uma referência para nós parlamentares. Centenas de questionamentos chegam na comissão quando eu realizo audiências públicas. Ideias como essas me permitem questionar os convidados que estão participando dos painéis. O e-Cidadania é um trabalho belíssimo, exemplo efetivamente de cidadania plena - afirmou Paim.
Qualquer cidadão pode apresentar ideias legislativas no portal e-Cidadania. Aquelas que alcançarem, em até 120 dias, o apoio de mais de 20 mil pessoas são transformadas em sugestões legislativas e enviadas para a análise dos senadores integrantes da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa.
Depois da análise dessa comissão, a sugestão, se aprovada, será transformada em projeto de lei, se rejeitada, será arquivada. Não são aceitas as ideias flagrantemente inconstitucionais ou que tratem de questões não relacionadas aos temas que o Senado pode votar.
Efeitos na educação
Segundo a senadora Lúcia Vânia (PSB-GO), os cursos de humanas são fundamentais para a formação das pessoas. Para ela, em um contexto geral, eles contribuem para a sociedade e para a formação do pensamento crítico.
- A formação humana precisa andar pari passu com o desenvolvimento científico, porque não podemos nos esquecer da destinação do progresso científico: é a humanidade. Qualquer tentativa de avanço que não leve isso em conta é um retrocesso. Como presidente da Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado, defendo a pluralidade – disse.
Para a senadora Fátima Bezerra (PT-RN), a proposta de extinção dos cursos na área de humanas fere a concepção de educação, que tem como pressuposto, como ressaltou, a formação para a cidadania. Segundo ela, não se pode prescindir jamais da área de formação no campo das ciências humanas, pois é universal.
Japão
Em 2015, o ministro da Educação do Japão, Hakubun Shimomura, publicou uma nota recomendando que a administração das universidades japonesas “tomassem medidas para abolir organizações de ciências humanas e sociais ou convertê-las para servir a áreas que atendessem melhor as necessidades da sociedade”. Desde então, várias universidades japonesas que possuíam departamentos de ciências humanas fecharam esses cursos ou reduziram o corpo docente.
O Conselho de Ciência do Japão, organização multidisciplinar de cientistas japoneses, publicou uma declaração expressando oposição e preocupação em relação ao que isso possa representar para o meio acadêmico.
"A academia contribui para a criação de uma sociedade culturalmente e intelectualmente mais rica. Vemos como a nossa missão produzir, aperfeiçoar e compartilhar percepções equilibradas e aprofundadas de conhecimento acerca da natureza, dos seres humanos e da sociedade. Portanto, ciências humanas e sociais fazem uma contribuição essencial para o conhecimento acadêmico como um todo", diz a declaração.
Fonte: Agência Senado