Ilha do Netinho é declarada 'patrimônio turístico e paisagístico' de Juara/MT.
Em sentença do juiz, Alexandre Sócrates Mendes, datada do dia 25 de julho, o magistrado julgou improcedentes os pedidos do Ministério Público de interdição da Ilha Paraíso Dourado (ilha do netinho) e condenou o próprio MP ao pagamento das custas processuais em dez mil reais (10.000.00).
Maximiano Araújo Costa, conhecido como ‘netinho’ mantém o local de lazer que fica distante do centro da cidade, aproximadamente 11 quilômetros. Netinho investiu pesado na infraestrutura da ilha revitalizando todo o complexo e com todo o aparato de segurança para quem frequenta a ilha.
O Ministério Público impetrou ação civil pública contra o proprietário do local e agora o Poder Judiciário derruba a liminar e declara a área como “patrimônio turístico e paisagístico de Juara”.
A Ilha Paraíso Dourado (ilha do netinho), sempre recebeu todo o apoio da sociedade juarense que até um abaixo assinado já fez para manter o local em funcionamento, utilizada como bem de uso comum da população, tornando o local uma referência para os visitantes, inclusive de outros estados e até de países que já estiveram em Juara.
Conheça aqui a sentença do juízo, na integra:
Com Resolução do Mérito->Improcedência
Código n° 72807
Requerente: Ministério Público
Requerido: Maximiano Araújo Costa e outros
S E N T E N Ç A
I – RELATÓRIO
Trata-se de ação civil pública ambiental, em que o Ministério Público pleiteia a condenação da parte requerida, visando a destruição das edificações e pertenças compreendidas na Ilha do Netinho (ilha fluvial de aproximadamente 1,71 ha, com acesso no Km 9,8 da Rodovia MT-315, zona rural de Juara-MT, nas coordenadas de referência S 11°17' 50” e W 57°34'46”), e consequente remoção do entulho.
Aduz que os requeridos exploram ilegalmente uma ilha fluvial existente no Rio Arinos, zona rural de Juara/MT. Que a referida ilha conta com um restaurante associado a vasta área de lazer, contando com eletrificação, conforme se afigura no relatório fotográfico constante dos autos (f. 243/251).
Verbera que referido local foi vistoriado pelo IBAMA, em virtude de suposto descumprimento de normas ambientais.
Em virtude dessa autuação, o requerido celebrou um termo de ajustamento de conduta com a Sema e a Promotoria de Justiça de Juara, em 07/10/2.009. Referido TAC foi submetido ao Conselho Superior do Ministério Público, que foi devidamente homologado pelo órgão de cúpula ministerial.
Posteriormente, com a chegada de outro Promotor de Justiça em Juara, e transcorridos mais de 05 (cinco) anos da celebração do TAC, o aludido Promotor solicitou o Conselho Superior a anulação do TAC em virtude de suposta ilegalidade, culminando com a anulação em 06/07/2.015.
Diante disso, por entender que a situação fática retratada nos autos não se coaduna com o direito positivo vigente, o referido membro ministerial propôs a presente ação.
O pedido de antecipação dos efeitos da tutela foi indeferido (f. 311).
Devidamente citada, a parte requerida apresentou contestação em que, após discorrer longamente, pugna pela improcedência do pedido.
É o relatório.
II – FUNDAMENTAÇÃO
Diante da singularidade da questão em exame, entendo que é o caso de julgamento imediato da lide. Todas as preliminares suscitadas se confundem com o mérito, motivo pelo qual serão analisadas juntamente com este.
A questão controversa é sensivelmente distinta das dezenas de outras ações civis públicas que versam sobre ilhas fluviais em tramite nesta Comarca de Juara, motivo pelo qual, também merece um tratamento adequado!
- a) OCORRÊNCIA DA DECADÊNCIA ADMINISTRATIVA
A despeito de todas as considerações fáticas e jurídicas expostas na exordial, entendo que o pedido é de todo improcedente.
Como aduz o próprio requerente, o requerido utiliza-se da referida Ilha desde o ano de 1.998. Após a autuação pelo órgão ambiental houve a celebração de um TAC entre os requeridos, o Ministério Público, e a SEMA.
Referido TAC foi celebrado em 07/10/2.009, sendo devidamente homologado pelo Conselho Superior do MP. Passaram-se mais de 05 (cinco) anos sem que houvesse qualquer impugnação ao ajustamento de conduta homologado, ou mesmo o descumprimento de suas cláusulas.
Todavia, em virtude de provocação do Promotor de Justiça que subscreveu a exordial, o Conselho Superior do MP, após mais de cinco anos, anulou o referido TAC, por suposta ilegalidade. Para tanto, argumentaram que a cláusula primeira do TAC seria inexequível/ilegal, motivo pelo qual toda a avença padeceria de nulidade.
Ora, seria possível a parte requerida induzir o Promotor de Justiça da época a erro, além da SEMA, e o Conselho Superior do Ministério Público (que homologou o TAC), a firmarem e a homologar um TAC flagrantemente ilegal? A resposta a tal indagação só pode ser negativa, além de se inferir que a questão da suposta ilegalidade não é tão simplória como alegado na exordial!
Vê-se que por mais de 05 (cinco) anos a avença produziu todos os efeitos jurídicos dela decorrente, com o cumprimento de todas as obrigações por parte dos requeridos, que submeteram seus pedidos aos órgãos estatais competentes.
Pois bem. Após detida análise dos autos entendo que a pretensão veiculada na presente demanda encontra-se fulminada pela decadência administrativa, não podendo o administrado ser alijado em seu direito, por um ato protestativo do parquet.
Dispõe o art. 54 da Lei 9.784/1999, que trata do processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, aplicada subsidiariamente aos Estados e Municípios por analogia integrativa, in verbis:
“O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé”.
Não se desconhece o direito/dever da Administração Pública de poder rever seus atos se verificada sua ilegalidade, ilicitude ou nulidade (autotutela administrativa). É o que se depreende da leitura das seguintes súmulas do colendo Supremo Tribunal Federal, in verbis:
“Súmula 346: A administração pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos.
Súmula 473: A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial”.
Contudo, este poder/dever não poderá ser exercido de modo que venha a ferir situações jurídicas já estabelecidas, não podendo o administrado ficar indefinidamente sujeito ao exercício da autotutela do Poder Público, visto que, a despeito da inércia da Administração, devem ser respeitados os princípios da segurança jurídica e da boa fé.
Frise-se, por oportuno, que o próprio Supremo Tribunal Federal já se pronunciou de forma definitiva sobre esta questão, no MS nº 25.963 - DF, Rel. o Min. César Peluso, julg. 04.05.2007, in DJ 11.05.2007, in verbis:
“Não ocorrendo a má-fé dos destinatários do ato administrativo, ficaria a administração pública inibida de anulá-lo, assegurando, assim, a estabilidade das relações jurídicas, com base no princípio da segurança jurídica. Para essas situações, o art. 54 da Lei nº 9.784/99 deu a medida do que seria prazo razoável para influir no juízo de precedência do princípio da segurança jurídica sobre o da legalidade, no cotejo ou no 'balancing test' entre esses dois princípios em face da prolongada inação da administração pública no que diz com o exercício do seu poder (que para nós é um poder-dever) de autotutela”.
Ainda nesse sentido, colhe-se da jurisprudência os seguintes excertos:
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. REVISÃO DE ANISTIA CONCEDIDA COM FUNDAMENTO NA PORTARIA Nº 1.104/1964. DESNECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. ADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. MÉRITO. PORTARIA Nº 1.203/2012-MJ. DECADÊNCIA DO ATO DE ANULAÇÃO DA ANISTIA. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ DO ANISTIADO. IMPOSSIBILIDADE DE CONSIDERAR NOTAS E PARECERES EMANADOS PELA ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO COMO MEDIDAS IMPUGNADORAS DA VALIDADE DO ATO, NOS TERMOS DO ART. 54, § 2º DA LEI Nº 9.784/1999. PROVIMENTO DO RECURSO. 1. (...) 2. O prazo decadencial para a anulação de atos administrativos que geram efeitos favoráveis aos administrados é de cinco anos, nos termos do artigo 54 da Lei nº 9.784/1999, comportando apenas duas hipóteses de afastamento da decadência administrativa: a má-fé do beneficiário e a existência de medida administrativa impugnadora da validade do ato. 3. O processo administrativo de revisão da anistia do Impetrante expressamente afastou a existência de má-fé por parte do anistiado quando do requerimento para o reconhecimento dessa condição. 4. Não se qualificam Notas e Pareceres emanados por membros da Advocacia-Geral da União como "medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato", nos termos do § 2º do art. 54 da Lei nº 9.784/99, em razão da generalidade de suas considerações, bem como do caráter meramente opinativo que possuem no caso em tela. 5. Ademais, em se tratando de competência exclusiva para a concessão, revisão ou revogação de anistia política, somente ato do Ministro de Estado da Justiça, na qualidade de autoridade administrativa, tem o condão de uma vez destinado à impugnação específica de ato anterior, obstaculizar o transcurso do prazo decadencial para sua anulação. 6. Assim, como decorreu mais de cinco anos entre a Portaria que reconheceu a condição de anistiado ao Impetrante e a publicação da Portaria Interministerial nº 134/2011-MJ, ato conjunto entre o Ministro da Justiça e o Advogado-Geral da União que determinou a abertura de processo administrativo de revisão das anistias políticas concedidas com fundamento na Portaria nº 1.104/1964, do Ministro de Estado da Aeronáutica, constata-se a decadência do direito da Administração de anular o ato de concessão da anistia. 7. Recurso ordinário provido, com o restabelecimento da anistia política reconhecida ao Impetrante. (Recurso Ord. em Mandado de Segurança nº 31841/DF, 1ª Turma do STF, Rel. Edson Fachin. j. 02.08.2016, unânime, DJe 20.09.2016).
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. SUPRESSÃO DE RUBRICA DA FOLHA DE PAGAMENTO. REPOSIÇÃO AO ERÁRIO. INDEVIDA IMPLANTAÇÃO DE RUBRICA RELATIVA À VANTAGEM PECUNIÁRIA INDIVIDUAL DO ART. 5º DO DECRETO Nº 2.280/85. FALHA EXCLUSIVA DA ADMINISTRAÇÃO. DECADÊNCIA ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. PRECEDENTES. 1. O art. 54 da Lei 9.784/99 estabelece o prazo de 05 (cinco) anos para que a Administração Pública exercite o direito de revisão de seus próprios atos. Considerando que a implantação tida por indevida da rubrica se deu em 1996 e a sua supressão, em 2005, é de se reconhecer ter sido a matéria atingida pela decadência. 2. Ocorrida à decadência, a Administração não pode mais rever o ato, pois o direito passa a integrar o patrimônio jurídico do servidor. Do mesmo modo, resta afastada a obrigatoriedade de reposição ao Erário do pagamento de vantagem pecuniária decorrente de equívoco da Administração, porquanto se trata de verba auferida de boa-fé pelo servidor. 3. Ademais, a supressão de verbas da folha de pagamento de servidor público não prescinde do devido processo legal e, só após a conclusão do procedimento administrativo respectivo, poderá a Administração proceder à supressão da vantagem remuneratória. 4. Apelação e remessa oficial a que se nega provimento. (Apelação Cível nº 0024920-82.2005.4.01.3400/DF, 1ª Turma do TRF da 1ª Região, Rel. Convocado Jamil Rosa de Jesus Oliveira. j. 23.10.2014, unânime, e-DJF1 25.11.2014).
A reiteração de situações desse jaez é tão frequente, que além das já citadas súmulas do STF, o Tribunal de Justiça do Paraná também aprovou enunciado jurisprudencial acerca do tema, rezando que “Ressalvada a decadência administrativa prevista no art. 54 da Lei Federal Nº 9.784/1999 (prazo de cinco anos), é lícito à Administração Pública, por força do poder de autotutela, anular ou revogar seus próprios atos, quando eivados de vícios; entretanto, sempre que a decisão administrativa afetar interesses individuais é imprescindível que se faculte aos interessados o exercício do contraditório e da ampla defesa”. (Enunciado n° 32 - TJPR - Data: 08.10.2013).
Colhe-se de doutrina abalizada, ensinamento no mesmo sentido do apregoado nesta decisão:
“Em outras hipóteses, a lei fixa prazo extintivo para que a Administração adote determinada providência administrativa, sob pena de, não o fazendo no prazo, ficar impedida de adotá-la. Exemplo típico é do art. 54 da Lei nº 9.784/1999, que regula o processo administrativo federal. Segundo esse dispositivo, extingue-se em cinco anos o prazo para a Administração anular seus próprios atos, quando decorrem efeitos favoráveis para os administrados, ressalvada apenas a má-fé. Aqui se limita o exercício da autotutela administrativa e da possibilidade de desconstituição dos atos. Resulta, pois, nesse caso o surgimento de decadência, já que a Administração perde o próprio direito de anular seus próprios atos”. (JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO, in Manual de Direito Administrativo, 26. ed., São Paulo: Atlas, 2013, págs. 969).
Por fim, há de se ressaltar que no caso em comento não houve sequer a alegação de má-fé da parte requerida, que celebrou termo de ajustamento de conduta com o Ministério Público e a SEMA, sendo o respectivo termo devidamente homologado pelo Conselho Superior.
Todas as providências assinaladas no TAC foram observadas e obedecidas pela parte requerida, que somente não conseguiu a concessão dos atos administrativos enumerados, pois os respectivos órgãos, no exercício de suas funções, entenderam por bem em não concedê-los.
Entretanto, tal situação não decorreu de ato de vontade da parte requerida, mas sim da atuação de órgãos estatais independentes.
Todavia, a providencia adotada pelo Ministério Público deveria ter sido aviada dentro do prazo decadencial. Não respeitado o prazo de cinco anos, prestigia-se a segurança jurídica em detrimento da mera e estrita legalidade.
- b) “ILHA DO NETINHO” – Patrimônio Turístico e Paisagístico de Juara
A Ilha do Netinho, objeto do processo, a despeito de estar atualmente na posse da parte requerida, passou a ser utilizada como bem de uso comum do povo, onde a fauna e a flora estão preservadas e a disposição da sociedade de Juara e região, que possuem um lugar único de contemplação da natureza, verdadeiro ponto turístico e paisagístico.
O art. 216 da CRFB consagra a proteção ao patrimônio imaterial, constituído pelos bens de natureza material e imaterial, que, pelo seu valor artístico, estético, histórico, turístico, paisagístico ou arqueológico.
São considerados de interesse relevante para a permanência e identidade da cultura da sociedade brasileira, nos quais se incluem as edificações e os sítios de valor histórico e arqueológico, consoante os incisos IV e V do referido dispositivo. Nesse sentido, o § 1º daquele mesmo artigo incumbe ao Poder Público, com a colaboração da comunidade, o dever de tutelar o patrimônio cultural nacional por diversos meios de acautelamento e preservação, entre os quais o tombamento.
Não há dúvidas de que a Ilha do Netinho é patrimônio turístico e paisagístico do Município de Juara, sendo amplamente conhecida como o principal ponto turístico municipal.
A simples cogitação do fechamento e destruição do complexo arquitetônico existente na referida ilha, oriunda do ajuizamento da presente ação, gerou uma comoção social entre os munícipes, que se sentiram verdadeiramente alijados de seu patrimônio imaterial!
Prova disso, são as inúmeras manifestações contrárias ao pedido inicial, anexadas aos autos, as quais passa-se a enumerar:
- Ofício n° 010/2.016 da ACRIVALE – Associação dos Criadores do Vale do Arinos: “Considerando a mobilização da população juarense e a nossa condolência ao Sr. Maximiano Araújo Costa, popular Netinho, venho através deste, representando a Associação dos Criadores do Vale do Arinos – Acrivale e seus associados, manifestar apoio e reiterar a importância de um dos mais belos pontos turísticos do município de Juara: Ilha do Paraíso Dourado, denominada Ilha do Netinho.
Após iniciar suas atividades e funcionamento no ano de 1999, foram realizadas intervenções consideráveis e visionárias no local, para assim requalificá-lo. Edificou-se um belo restaurante, com arquitetura simples e acolhedora, utilizando materiais típicos e naturais do município. Para complementar o arranjo, foram realizados vários e necessários trabalhos de reflorestamento, contenção de barrancos e destinação correta do lixo, além de manter a linda e natural paisagem.
O ambiente proporciona à população lazer e contato direto com a natureza, podendo ser utilizado para eventos gerais, promovendo assim, a interação social e fomentando a economia do município. Tendo como ícone principal, a tradicional e saborosa peixada, culinária típica da região, tornando-se referência de todos que por ali passam.
Portanto, destaco a importância desse ponto turístico como patrimônio do município, e manifesto apoio para que o ambiente seja explorado e preservado pela população e pelos visitantes” – f. 424.
- Ofício n° 08/2016 da ACEAJU – Associação Comercial Empresarial de Juara: “Através deste A Associação Empresarial e Comercial (ACEAJU) vem manifestar apoio ao senhor Maximiano Araújo Costa, Conhecido popularmente como “Netinho”, pelo belíssimo trabalho realizado em seu restaurante, Ilha Paraíso Dourado, conhecido popularmente como “Ilha do Netinho”, como um ponto turístico, no qual desde 1999 vem trabalhando e sonhando com uma Juara melhor, assim mostrando o grande potencial turístico que a cidade possui e que infelizmente não é totalmente explorado
O local proporciona população um ambiente de lazer e contato com a natureza, além da realização de eventos como; Reunião de amigos, almoços beneficentes, festas de aniversários e casamentos, promovendo a interação social fomentando a economia local, e ainda é conhecido por sua famosa e saborosa peixada, que é um prato típico da nossa região, e sendo referência pelos que ali frequentam.
Para tanto, viemos destacar a importância deste ponto turístico como patrimônio do Município, e manifestar o nosso apoio para que o ambiente continue atendendo a população juarense, bem como nossos visitantes” – f. 425.
- Ofício n° 190/GP/2015 – Câmara Municipal de Juara: “Considerando a mobilização da população juarense e a nossa condolência ao Senhor Maximiano Araújo Costa, popular Netinho, viemos manifestar apoio, bem como reiterar a importância de um dos mais belos pontos turísticos do município de Juara: Ilha Paraíso Dourado, popular “Ilha do Netinho”.
A Ilha do Netinho iniciou seu funcionamento no ano de 1999, em um local árido, o qual se destinava a criação de ovelhas. Por iniciativa pessoal do Senhor Netinho, foram realizadas intervenções consideráveis e visionárias no local, requalificando-o.
(...) Realizando uma pesquisa superficial pelo site de buscas “google”, nota-se que a Ilha do Netinho é um dos principais pontos turísticos de nosso município, sendo citada em quase todos os sites ligados a divulgação de Juara. Lembramos ainda, que nosso município possui forte potencial turístico, porém, este necessita ser melhor explorado, assim não podemos deixar que esse forte elemento se perca” – f. 426/427.
- Ofício 190/GP/2015 da CDL – Centro de Dirigentes Lojistas – f. 428.
- Ofício da Paróquia São José – f. 430.
- Ofício da Igreja do Evangelho Quadrangular – f. 431/432.
- Ofício n° 001/2016 da Maçonaria Grande Oriente do Brasil – f. 433/434.
- Ofício do Prefeito Municipal de Juara – f. 435.
- Ofício n° 079/2016 da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Turismo e Lazer de Juara: “... O município de Juara-MT apresenta um grande potencial turístico, mais ainda pouco explorado, destacando-se os recursos naturais, a realização de alguns eventos tradicionais e a presença de fatores culturais como a cultura indígena e o artesanato local. Evidentes vocações turísticas, que se desenvolvidas de forma sustentável e planejadas podem tornar-se um importante diversificador da economia local.
Diante todo o exposto, tendo em vista a representatividades deste atrativo turístico para o município de Juara-MT, principalmente para o desenvolvimento do turismo, ressaltamos a importância deste espaço se manter em funcionamento e continuar atendendo a população juarense, bem como os visitantes” – f. 436.
- Ofício n° 007/2016 da SIMAVA – Sindicato das Industrias Madeireiras do Vale do Arinos – f. 437/438.
- Ofício n° 030/2016 do SISMUJ – Sindicato dos Servidores do Município de Juara – f. 439.
12 Ofício contendo manifestação pública em prol do não fechamento da Ilha do Netinho, assinado por centenas de munícipes – f. 440 e seguintes.
A respeito da defesa do patrimônio imaterial em juízo, aponta a doutrina especializada:
Além da defesa de outros interesses difusos e coletivos, cuida expressamente a Lei n° 7.347/85 da defesa em juízo dos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, a que se vem convencionando chamar em doutrina de patrimônio cultural (artigo 1°, III, da Lei da Ação Civil Pública). A Constituição de 1988, nos seus artigos 215-6, alargou bastante a abrangência dos interesses culturais, que evidentemente passam a merecer proteção também por via judicial. (Hugo Nigro Mazzilli, A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo, 5ª edição, revista, ampliada e atualizada, 1993, Editora Revista dos Tribunais, pág. 102).
O escólio do mesmo HUGO NIGRO MAZZILLI é esclarecedor:
Fica claro, no exame da legislação, que tanto se protege o patrimônio público tombado como o não tombado. Em caso de tombamento, temos proteção administrativa especial. Sempre que o legislador, por qualquer razão, quis exigir tombamento, ele o explicitou claramente. Na Lei 7.347/85, entretanto, o legislador não limitou a proteção jurisdicional de valores culturais apenas aos bens tombados — e seria rematado absurdo se o fizesse.
Afinal, nada impede que um bem tenha acentuado valor cultural, mesmo que ainda não reconhecido ou até mesmo se negado pelo administrador; quantas vezes não é o próprio administrador que agride um bem de valor cultural ?!
O tombamento, na verdade, é um ato administrativo complexo: de um lado, declara ou reconhece a preexistência do valor cultural do bem; de outro, constitui limitações especiais ao uso e à propriedade do bem. Quanto ao reconhecimento em si do valor cultural do bem, o tombamento é ato meramente declaratório e não constitutivo desse valor; pressupõe este último e não o contrário, ou seja, não é o valor cultural que decorre do tombamento.
“Admitir que necessário fosse o prévio tombamento para posterior defesa em juízo, seria, na verdade, tornar inócua na maioria das vezes a proteção jurisdicional. Se só bens tombados (definitiva ou provisoriamente) pudessem ser protegidos pela ação civil pública, por absurdo nem mesmo uma cautelar, dita satisfativa, destinada a impedir um dano iminente, poderia ser proposta, se o bem de valor cultural não estivesse tombado ... Frustrar-se-ia o escopo das leis, seja o da Lei n. 7.347/85 (que cuida não só da reparação do dano, como de sua prevenção), seja até mesmo o escopo da Constituição da República (cujo art. 216, § 4º, prevê punição não só pelos danos, como pelas próprias situações de risco causadas ao patrimônio cultural).
Além do mais, partindo do raciocínio de que o bem tenha valor cultural para a comunidade, titulares deste interesse são os indivíduos que compõem a coletividade (por isso que o interesse é difuso). Ora, seria inadmissível impedir, por falta de tombamento, o acesso ao Judiciário para proteção a valores culturais fundamentais da coletividade. Não há nenhuma exigência da lei condicionando a defesa do patrimônio cultural ao prévio tombamento administrativo do bem, que, como se viu, é apenas uma forma administrativa, mas não sequer a única forma de regime especial de proteção que um bem de valor cultural pode ensejar”. (MAZZILI, Hugo Nigro, A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo (meio ambiente, consumidor e patrimônio cultural) São Paulo, Revista dos Tribunais, 1991. 3. ed, p. 85/86).
No mesmo sentido é a expressiva lição de EDIS MILARÉ:
"Como se disse, e não faz mal repetir, o reconhecimento de que determinado bem tem valor cultural não é privativo do Poder Legislativo ou do Executivo, podendo também ser emanado do Poder Judiciário.
Essa a linha preconizada pela Lei nº 7.347/85, que tornou possível a inclusão de bens no patrimônio cultural brasileiro por meio de decisão judicial, independentemente do critério administrativo. Aliás, pode ocorrer que a falta de proteção de tais bens decorra exatamente da omissão do poder público, ou seja, do ato de tombamento, de forma que, se esse fato ocorre, é através da ação civil pública que os legitimados buscarão a necessária tutela jurisdicional. A propósito não custa lembrar que o tombamento não constitui, mas apenas declara a importância cultural de determinado bem, motivo pelo qual mesmo coisas não tombadas podem ser tuteladas em ação civil pública.
Realmente, a identificação do valor cultural de um bem não emerge da mera criação da autoridade, visto que ele já tinha existência histórica no quadro da sociedade. O fato de um bem determinado pertencer ao patrimônio cultural ou, como diz a lei, ser bem ou direito 'de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico', pode ser provado no curso da ação civil pública e referendado por provimento jurisdicional". (MILARÉ, Édis. Direito do ambiente. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p.193)
Com efeito, hodiernamente é incontroversa a possibilidade de se proteger determinado patrimônio cultural, turístico, artístico ou paisagístico através de um provimento emanado do Poder Judiciário. Tanto isto é certo que a Lei de Crimes Ambientais, na Seção atinente aos Crimes contra o Ordenamento Urbano e o Patrimônio Cultural, tipificou:
Art. 62. Destruir, inutilizar ou deteriorar:
I - Bem especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial;
II - Arquivo, registro, museu, biblioteca, pinacoteca, instalação científica ou similar protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial:
Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.
Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena é de seis meses a um ano de detenção, sem prejuízo da multa.
Art. 63. Alterar o aspecto ou estrutura de edificação ou local especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial, em razão de seu valor paisagístico, ecológico, turístico, artístico, histórico, cultural, religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida:
Trilhando esta linha de entendimento, a jurisprudência tem se manifestado a respeito da possibilidade de decisão judicial ser apta a reconhecer determinado bem como patrimônio cultural, turístico, artístico ou paisagístico, garantindo-lhe a proteção constitucional descrita no art. 216 da CRFB, in verbis:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA - Obrigação de não fazer - Preservação da construção de edifício - Valor histórico e arquitetônico - Lei a respeito não aprovada - Irrelevância – Interesse Público que pode ser defendido como realidade social - Reconhecimento de sua existência que pode ser feito pelo Judiciário, não sendo privativo do órgão Legislativo ou Administrativo - Sentença anulada - Prosseguimento do feito ordenado – Recurso Provido. (RJTJESP - 114/38).
AÇÃO CIVIL PÚBLICA - Preservação de praça pública - Valor histórico e paisagístico - Interesse da comunidade, no sentido do resguardo de tradições locais - Reconhecimento de sua existência que pode ser efetivado pelo Judiciário, não sendo privativo do órgão Legislativo ou Administrativo - Lei Federal n. 7.347, de 1985 – Ação Procedente - Recursos não providos." (RJTJESP 122/50).
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PATRIMÔNIO CULTURAL. AUSÊNCIA DE TOMBAMENTO. IRRELEVÂNCIA. POSSIBILIDADE DE PROTEÇÃO PELA VIA JUDICIAL. INTELIGÊNCIA DO ART. 216, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Não há qualquer exigência legal condicionando a defesa do patrimônio cultural - artístico, estético, histórico, turístico, paisagístico - ao prévio tombamento do bem, forma administrativa de proteção, mas não a única. A defesa é possível também pela via judicial, através de ação popular e ação civil pública, uma vez que a Constituição estabelece que "o Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento, desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação." (art. 216, § 1º). (TJSC - Apelação cível n. 97.001063-0, de Criciúma. Relator: Des. Silveira Lenzi. J. 24/08/1999)
Dessume-se, à luz do expendido que consoante o disposto no art. 216 da CRFB o que torna um bem dotado de valor cultural é o seu valor em si, é a natureza do próprio bem, reconhecido como tal pela própria sociedade, e não o fato de estar protegido legal ou administrativamente. Dessa forma, é possível a defesa do patrimônio imaterial, ainda que não reconhecida pelo poder público, por via judicial.
Nesta senda, consubstanciado na manifestação do Poder Legislativo e Executivo Municipal, além de maciça manifestação popular materializada através de entidades representativas da sociedade, além das centenas de populares que assinaram manifestação em favor da manutenção da referida ilha, considero que a Ilha do Netinho configura verdadeiro patrimônio turístico e paisagístico do Município de Juara, motivo pelo qual deve ser preservado e protegido, nos termos do art. 216 da CRFB.
III – DISPOSITIVO
FORTE EM TAIS FUNDAMENTOS, declarando a Ilha do Netinho como verdadeiro patrimônio turístico e paisagístico do Município de Juara, julgo improcedentes os pedidos, extinguindo o feito com resolução do mérito, nos termos do art. 487, inc. I, do CPC.
Condeno a parte requerente das custas processuais e ao pagamento de honorários advocatícios, que arbitro equitativamente em R$ 10.000,00 (dez mil reais).
Determino a extração de cópia integral dos autos, e sua consequente remessa ao Gabinete da Prefeita Municipal e a Câmara dos Vereadores do Município de Juara, visando o reconhecimento administrativo e/ou legislativo da Ilha do Netinho como patrimônio turístico e paisagístico do Município de Juara.
Sentença sujeita ao reexame necessário.
P.R.I.C.
Em Juara/MT, 25 de julho de 2017.
ALEXANDRE SÓCRATES MENDES.
Fonte: ASCOM/Câmara Municipal/Juara com informações do Poder Judiciário.